Julgo este assunto de especial relevância tanto para médicos como para pacientes. A incidência de abortos
espontâneos no primeiro trimestre é de 15 a 20% das gestações clinicamente
diagnosticadas. As anomalias cromossômicas são responsáveis por mais de 50%
dos abortos espontâneos. A extrema maioria (90%) destas anomalias cromossômicas
são numéricas, mais especificamente as trissomias autossômicas (envolvendo os
cromossomos 13, 16, 18, 21 e 22), as poliploidias e a monossomia X. No nascimento,
anomalias cromossômicas são também importante causa de malformações congênitas,
ocorrendo em cerca de 0,55% dos recém-nascidos (autossômicas 0,40% e
cromossomos sexuais 0,15 %). É importante assinalar que as trissomias resultam
da não-disjunção meiótica materna na gametogênese e seu risco de ocorrência aumenta
com a idade materna. Ao contrário do risco de trissomias, o risco para
poliploidias e para monossomia X (síndrome de Turner) não aumenta com a idade materna.
No período pré-natal, o diagnóstico ultrassonográfico de algumas trissomias
autossômicas como a trissomia 13 e 18 é possível com base nas múltiplas
malformações frequentemente associadas, enquanto o diagnóstico da trissomia 21
continua sendo um desafio, pois há ausência de malformações associadas em mais
de 50% dos casos. Na síndrome de Turner, a forma letal cursa com higroma
cístico cervical e hidropsia, mas a forma não letal é muitas vezes de difícil
reconhecimento pela ultrassonografia no segundo trimestre. As cinco anomalias
cromossômicas mais frequentemente encontrados (trissomia 13 , 18, 21 , síndrome
de Turner e triploidia) são inclusive chamadas hoje de 5Ts.
As anomalias cromossômicas numéricas são passíveis de diagnóstico pré-natal pelo cariótipo fetal, que pode ser obtido, por exemplo, por amniocentese ou biópsia de vilosidades coriônicas. Algumas destas anomalias (as mais frequentes) podem ser pesquisadas através do DNA livre no sangue materno. Cabe ressaltar que diante de suspeitas que aumentem significativamente o risco para doenças genéticas, é recomendável o diagnóstico pelo cariótipo convencional, visto que triploidias, translocações e deleções cromossômicas, por exemplo, não são detectadas pelo DNA livre no sangue materno. Com isso, podemos afirmar que o rastreio convencional por ultrassonografia, realizado de 11 a 13 semanas e 6 dias, se mantém essencial para o diagnóstico pré-natal. Neste exame, além do rastreio de anomalias cromossômicas pela translucência nucal e outros marcadores, é realizado o estudo morfológico de I trimestre, onde podem ser diagnosticadas malformações cerebrais, cardíacas, da coluna vertebral, dos membros e da parede abdominal, por exemplo, onde o cariótipo pode ser normal. O rastreio de comorbidades, como o risco para pré-eclâmpsia, também é realizado nesta oportunidade, para eleger as pacientes que podem ser beneficiadas pelo AAS.
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